Modafilina



Conversando em uma roda de amigos, tive contato com algumas pessoas que estavam fazendo uso do Stavigille mesmo sem ter nenhum sintoma que justificasse tal uso. Disseram que isso os ajudava a manter o foco nas atividades que estavam desempenhando e diminuir o tempo necessário de sono. Ainda informaram que estavam tomando 50mg da droga por dia, ao invés dos 200mg... Fiquei curioso e tentado a também fazer o uso do medicamento (se é que exista a possibilidade disso, pois atualmente no Brasil é um remédio tarja preta, mas pesquisei e vi que em outros países é vendido livremente...). Gostaria de saber quais os efeitos colaterais da droga tendo em vista uma dosagem diária de 50mg/dia, isso realmente é arriscado? Sei que o princípio ativo é a modafinila, mas sinceramente não sei se vicia (apesar de não ser uma anfetamina, pode ser que cause vício)... O uso continuado do medicamento chega a causar dependência?

A modafinila (Stavigille) tem ação estimulante sobre o sistema nervoso central e é utilizada para o tratamento do sono excessivo associado à narcolepsia (síndrome caracterizada por sono durante o dia, mesmo quando a pessoa dormiu bem durante a noite). No Brasil, o medicamento é controlado e vendido somente acompanhado por uma notificação de receita. Em 2010, a agência responsável pelos medicamentos na Europa (EMEA) divulgou um alerta recomendando uma limitação no uso deste medicamento, indicando-o somente para a narcolepsia (1). Esta limitação é resultado de uma avaliação sobre o equilíbrio entre os riscos e os benefícios do uso do medicamento, ou seja, a agência considerou que os riscos só compensavam para pacientes portadores da síndrome da narcolepsia.

Os estudos que avaliam os efeitos adversos são feitos geralmente para as doses usuais (100 e 200 mg) e incluem dores de cabeça, nervosismo, insônia, agitação, confusão, alterações de personalidade, tremores e ansiedade. Também pode ocorrer problemas gastro-intestinais como enjoo, dor abdmominal, boca seca, diarréia ou prisão de ventre e perda de apetite. Além disso, são descritas reações graves de pele que exigem hospitalização, a chamada síndrome de Stevens-Johnson, e alterações psiquiátricas mais graves como depressão, alucinações, ideias suicidas e mania. Os efeitos cardiovasculares como aumento na pressão e coração acelerado também foram relatados. Como todos os estimulantes, existe o potencial de dependência com o uso prolongado (2).

Além dos riscos de efeitos adversos, existe também a possibilidade de interação da modafinila com diversos medicamentos, tais como anticoncepcionais, antifúngicos (itraconazol, cetoconazol), medicamentos para pressão (propranolol), antidepressivos (desipramina), antibióticos (claritromicina), etc. Em alguns casos, o efeito é diminuído e em outros pode ser potencializado. O paciente também deve evitar o uso com álcool, uma vez que a segurança desta interação não foi estabelecida (2).

Alguns estudos que avaliaram os efeitos da modafilina em pessoas saudáveis (doses de 100 a 200mg) para melhorar algumas habilidades mentais tem como limitação o pequeno número de pacientes envolvidos (3,4). Os resultados observados nestes trabalhos são contraditórios e alguns autores afirmam inclusive que os efeitos são pequenos e não justificam seu uso (4).

Portanto, pelos riscos de efeitos adversos juntamente com ausência de dados relevantes sobre a eficácia do uso deste medicamento para melhorar a concentração em pessoas saudáveis, a modafilina não deve ser empregada para fins recreativos, em casos onde não exista um problema de saúde específico. Por fim, vale destacar ainda que existem outras medidas não-medicamentosas para melhorar o desempenho cognitivo, tal como, alimentação balanceada e atividade física (5).

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Referências:
1. EMEA. European Medicines Agency recommends restricting the use of modafinil (issued 22 July, 2010). Disponível em: http://www.ema.europa.eu/docs/en_GB/document_library/Press_release/2010/07/WC500094976.pdf (acesso em 14/08/2014).
2. Modafinil. In: Martindale [database on the Internet]. Ann Arbor (MI): Truven Health Analytics; 2013 [. Disponível em: www.micromedexsolutions.com (acesso em 14/08/2014).
3. Müller U, Rowe JB, Rittman T, Lewis C, Robbins TW, Sahakian BJ. Effects of modafinil on non-verbal cognition, task enjoyment and creative thinking in healthy volunteers. Neuropharmacology. 2013 Jan;64:490–5.
4. Randall DC, Viswanath A, Bharania P, Elsabagh SM, Hartley DE, Shneerson JM, et al. Does Modafinil Enhance Cognitive Performance in Young Volunteers Who Are Not Sleep-Deprived?: Journal of Clinical Psychopharmacology. 2005 Apr;25(2):175–9.
5. Maslen H, Faulmamuller N, Savulescu J. Pharmacological cognitive enhancement - how neuroscientific research could advance ethical debate. Frontiers in Systems Neuroscience [Internet]. 2014 Jun 11;8. Disponível em: http://www.frontiersin.org/Systems_Neuroscience/10.3389/fnsys.2014.00107/abstract (acesso em 14/08/2014).

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